A princípios do processo tributário

            É raro o estudo quanto à prova no processo tributário. A princípio é importante a seguinte colação: “toda a investigação processual resulta de uma atividade de confirmação ou prova de um conjunto de fatos afirmados previamente em juízo sobre certos acontecimentos e destina-se, como finalidade última, à demonstração da realidade dos fatos já alegados e que falta confirmar” [1]. Acrescenta-se, ainda, “o processo tributário será o conjunto de atos concretizadores e exteriorizadores da vontade dos agentes jurisdicionais tributários (tribunais tributários)” [2].

            Não diferente do processo civil, a produção de provas necessárias à formação da convicção do tribunal, a fim de organizar meios para uma boa decisão, valem-se, aqui, os postulados da livre determinação das diligências de produção de prova, da cooperação e da boa-fé recíprocos e do contraditório, entre outros.

            O regime da prova nos processos de execução fiscal conta com a aplicação subsidiária do direito processual civil ao processo e ao procedimento tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos.

            São alguns dos princípios legais atinentes à prova: (i) da livre apreciação da prova; (ii) da legalidade; (iii) do contraditório; (iv) da oficiosidade e do inquisitório; e (v) da aquisição processual, entre outros. Abaixo, breves considerações a respeito de cada um deles.

            Princípio da livre apreciação da prova

            O art. 371 do Código de Processo Civil vigente, faculta-se ao juiz apreciar a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. Acrescenta-se o fato de ficar-lhe proibido exercer esse poder sobre fatos e circunstâncias não constantes dos autos.

            O compromisso da fundamentação das decisões está previsto no art. 93, inciso IX da Constituição Federal, que preceitua “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

            Neste sistema da livre apreciação da prova o juiz valorará a prova, de acordo com cada caso específico, valendo-se de sua experiência e convicção. É o que diz Nelson Nery Júnior: “A exteriorização de opiniões doutrinárias em publicações (livros e artigos), dissertações e teses acadêmicas (v.g., mestrado, doutorado, livre docência), como também em palestras e conferências, não constitui per se causa de parcialidade do juiz. De outra parte, o juiz não fica vinculado às opiniões de seus escritos publicados, nem aos entendimentos que exteriorizou em sentenças que proferiu, pois deve estar sempre aberto a novos e melhores argumentos” [3].

            Neste ponto, importa trazer o entendimento de José Frederico Marques, ao tratar da independência do juiz enquanto ordem política e ordem jurídica: “aquela, é a base e alicerce da última, consiste nas garantias que cercam os membros da magistratura, tais como a irredutibilidade de vencimentos, a inamovibilidade e vitaliciedade; a independência jurídica, por sua vez, é a não-subordinação do juiz, quando no exercício de suas funções, a não ser a lei” [4].

            Por fim, importante destacar que há limitações exógenas e endógenas a este princípio. Considera-se limites endógenos “o grau de convicção requerido para a decisão, a proibição de meios de prova e a observância do princípio da presunção de inocência”, estes, extraídos do processo penal. Já limite exógeno se traduz pela observância do princípio in dúbio pro reo.

            Princípio da legalidade

            O princípio da legalidade tem o juiz como figura principal. Isso significa dizer que, no exercício de sua atividade, é o juiz que zela pelo cumprimento deste princípio.

            Em relação ao processo, o princípio da legalidade se caracteriza pela imposição de uma tramitação processual específica, a qual tem como consequência a nulidade dos atos cuja prática não seja admitida ou que possam influir no exame da boa decisão da causa [5].

            Conforme a síntese de Caio Tácito, o princípio da legalidade, estabelecido como fundamento de direitos individuais e, por natural desdobramento, de direitos políticos da representação popular na constituição dos poderes, reprime o absolutismo do Poder estatal e condiciona a atividade da Administração Pública.

            Heleno Torres descreve os seguintes papéis que o princípio da legalidade desempenha em matéria tributária: “i) princípio da reserva de lei formal, quanto às matérias para as quais a Constituição exige lei específica; ii) princípio da tipicidade ou legalidade material; iii) princípio da vinculatividade ou princípio da preeminência, que exige a submissão de todos os atos administrativos à vontade legislativa, pois a vontade da Administração Pública não representa ordem, mas cumprimento da legalidade, à luz do consentimento expedido pelo povo” [6]

            Em verdade, o conceito de legalidade pressupõe, como limite à discricionariedade, que os motivos determinantes sejam razoáveis e o objeto do ato proporcional à finalidade declarada ou implícita na regra de competência.

            De modo geral, o princípio da legalidade e seus desdobramentos, confere autenticidade ao lema da Revolução Francesa, traduzido pela liberdade, igualdade e fraternidade. É por meio do princípio da legalidade que o Estado entra em conformidade com as normas legais, ficando, ele, impedido de agir com arbítrio em suas relações com os indivíduos.

            Princípio do contraditório

            Este princípio, juntamente com o do devido processo legal e da ampla defesa, são princípios constitucionais gerais do processo por excelência, incidentes imediatamente em todas as espécies processuais do ordenamento jurídico brasileiro.

            O contraditório assegura a participação do interessado em todo o curso do processo administrativo, podendo influenciar ativamente na decisão a ser proferida. Camila Monteiro Pullin Milan considera tal princípio como a garantia de ser certificado da existência e do conteúdo do processo, sendo-lhe assegurada a manifestação a respeito de todos os atos e fatos processuais. As manifestações das partes devem ser apreciadas de modo equitativo pelo órgão julgador e devem ser levadas em conta na decisão final. É, antes de tudo, modo de exercício da cidadania e instrumental para a realização do Estado Democrático de Direito.

            Princípio da oficiosidade e do inquisitório

            No procedimento tributário, a ação do Fisco funciona por deveres legais. Para Seabra Fagundes, administrar é aplicar a lei de ofício. Dessa forma, devido ao dever de ofício, cabe ao Fisco investigar periodicamente os contribuintes, revisar suas declarações e exigir o pagamento dos tributos e das multas.

            Em relação ao processo tributário, o impulso inicial é dado pelo sujeito passivo, o contribuinte da relação tributária, contudo, a condução dos atos do processo incumbe à autoridade julgadora, até a sua conclusão, sob pena de responsabilização funcional.

            Em relação ao princípio inquisitivo, as partes têm liberdade de limitar a atuação investigativa do julgador aos fatos que elas trazem ao processo.

            Princípio da aquisição processual

            Por fim, o princípio da aquisição processual é o que vai indicar a atividade instrutória realizada no processo, que visa, essencialmente, determinar quais os fatos estão provados, independentemente da distribuição de ônus da prova entre as partes.

              Também conhecido como o princípio da comunhão da prova, “ao indicar que a prova é do processo e não das partes ou do juiz, evita que tal procedimento seja adotado, não podendo a parte dispor de algo que não é dela, e sim do processo. A prova, dessa forma, prejudicial ou benéfica a quem quer que seja, jamais será afastada do convencimento do juiz por “arrependimento” da parte que requereu sua produção” [7].

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] RANGEL, Rui. A Prova e a Gravação de Audiência no Direito Processual Civil. Edições Cosmos, Lisboa, 1998, pág. 27.

[2] ROCHA, Joaquim Freitas da. Lições de Procedimento e Processo Tributário. 4ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, março de 2011, pág. 232.

[3] MARQUES, José Frederico. Instituições de Direito Processual Civil: volume I. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p. 147.

[4] ROCHA, Joaquim Freitas da. Lições de Procedimento e Processo Tributário. 4ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, março de 2011.

[5] NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo na Constituição Federal. 13 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, págs. 177 – 178.

[6] TORRES, Heleno. Direito Tributário e Direito Privado, p. 56.

[7] LIMA, Marcellus Polastri. A prova penal2. ed. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2003.

 

Por Iara Coimbra Teixeira e revisado por André Luiz Martins Freitas

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