Por Iara Coimbra Teixeira
Instituído pela Lei Federal nº 12.546/2011, regulamentada à época pelo Decreto nº 7.633/11, o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para Empresas Exportadoras (“Reintegra”) tem como objetivo reintegrar valores referentes a custos tributários federais residuais existentes na sua cadeia de produção.
Tal regime especial goza de caráter de benefício fiscal, estipulando, pelo que se extrai da Lei 13.043/2014, a devolução parcial ou integral do resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens importados.
Assim, produtos fabricados e exportados estão contemplados com o benefício do Reintegra. O crédito tributário garantido por meio do regime às empresas exportadoras pode ser usado para o pagamento de tributos federais, como o PIS e a Cofins, o IRPJ, o IPI, entre outros.
A Portaria nº 428, de 30 de setembro de 2014, do Ministério da Economia, estabeleceu, por tempo indeterminado, como benefício do Reintegra, um percentual de 3% sobre a receita de exportação de bens industrializados. Em fevereiro do ano seguinte, os contribuintes foram surpreendidos com a edição do Decreto nº 8.415/2015, que, alterando a regulamentação do programa, inesperadamente diminuiu o percentual do benefício para 1% a partir do mês de março de 2015 e para 0,1% relativamente ao mês de dezembro de 2015.
O mesmo Decreto nº 8.415/2015 estabeleceu, no §7º, III, do seu art.2º, como benefício do Reintegra, um percentual de 2% sobre a receita de exportação de bens industrializados, entre janeiro de 2017 a dezembro de 2018.
Porém, também de forma inesperada, em maio de 2018, o Decreto nº 9.393 alterou a regulamentação do programa e diminuiu o percentual do benefício para 0,1% a partir do mês de junho de 2018. Esta medida, como foi noticiada, foi utilizada pelo Governo Federal como uma forma de compensar a redução de tributos incidentes sobre o óleo diesel, uma das medidas oferecidas ao setor de transporte de cargas em negociação para pôr fim à greve dos caminhoneiros, que havia ocorrido naquela época.
A redução do benefício em 2015 e em 2018 implicou no aumento da carga tributária suportada pelos contribuintes, de modo que devem sujeitar-se aos princípios constitucionais que se submete o sistema jurídico tributário, notadamente o princípio da legalidade, previsto no art. 150, inciso I da CRFB/88.
A Lei nº 13.043/14, em seu art. 22, prevê que as pessoas jurídicas exportadoras poderão apurar crédito, mediante a aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo, sobre a receita auferida com a exportação de determinados bens.
Esta previsão viola o princípio da legalidade, pois, o Poder Executivo, ao manipular o percentual do benefício, poderá reduzi-lo, o que acarretará majoração de tributo, o que poderia ser feito somente por meio de lei em sentido estrito, conforme expressa previsão constitucional.
O mencionado decreto, ao reduzir o mencionado benefício fiscal em 2018, não respeitou o princípio constitucional da anterioridade, que veda o aumento de tributo no mesmo exercício da lei que o instituiu. Nem mesmo o princípio da anterioridade nonagesimal, também previsto na Constituição, foi respeitado. A redução do benefício em 2018 implicou no aumento da carga tributária suportada pelos contribuintes, de modo que a redução do percentual do benefício deve sujeitar-se aos princípios constitucionais que informam a tributação, notadamente ao princípio da anterioridade.
Sobre o assunto, o Tema 1.108, de repercussão geral, discute a aplicabilidade da anterioridade geral (anual ou de exercício) em face das reduções de benefícios fiscais previstos no Reintegra, ocorridas nos Decretos 8.415/2015 e 9.393/2018. Trata-se de recurso extraordinário com base no art. 150, III, b, da Constituição Federal.
A questão constitucional levada à apreciação do STF, qual seja, a aplicabilidade da regra da anterioridade do exercício financeiro e da anterioridade nonagesimal, foi balizada pelos princípios da segurança jurídica e da não surpresa e o respeito à previsibilidade orçamentária do contribuinte.
A temática tem reconhecida relevância a respeito do potencial impacto em outros casos, tendo em vista a multiplicidade de recursos sobre a questão constitucional.
Nesta semana, o STF iniciará o julgamento de duas ações sobre o tema de interesse das exportadoras nacionais. O STF definirá se o Poder Executivo pode fixar os percentuais do Reintegra.
Adianta-se que a delegação para o Poder Executivo da manipulação dos percentuais do benefício é contraditória com a observância da finalidade do Reintegra.
As reiteradas alterações no benefício não são fruto de uma análise pormenorizada dos resíduos tributários remanescentes na cadeia de produção de bens exportados. Isto fica evidente em um dos decretos, onde houve a previsão de redução do benefício em um período, e o aumento do benefício em outro período. Como exposto acima, esta medida, como foi noticiada à época, foi utilizada pelo Governo Federal como uma forma de compensar a redução de tributos incidentes sobre o óleo diesel, uma das medidas oferecidas ao setor de transporte de cargas em negociação para pôr fim à greve dos caminhoneiros, que havia ocorrido naquela época. Ou seja, buscou-se a solução de um problema, que não tem nenhuma relação com benefício, e sim com o caixa do Governo Federal, ignorando a finalidade do Reintegra, e reduzindo, por consequência, o benefício.