Inconstitucionalidade das restrições à dedutibilidade dos Juros sobre o Capital Próprio inserida na MP 1.185/2023

Por Fernanda Vargas e João Palhares

A MP 1.185/2023, conhecida como MP das subvenções, convertida em lei pelo congresso nacional em 26/12/2023, tratava originalmente das subvenções de ICMS concedidas pelos Estados.

Conforme matéria do jornal Poder 360, o Governo Federal propôs a inclusão, na MP 1.185/2023, de alterações legislativas referentes ao tratamento dos Juros sobre o Capital Próprio.

No fim de agosto, o Governo já havia enviado ao congresso um projeto de lei que tratava do mesmo tema, considerando, entretanto, que o texto não avançou na Câmara, optou-se pela inserção na MP das subvenções.

Os Juros sobre o Capital próprio são uma forma de remunerar os acionistas de uma empresa. As empresas que distribuem Juros sobre o Capital Próprio podiam, em seus documentos contábeis, lançar os valores distribuídos como despesa e assim deduzir da base de cálculo do seu Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

Entre as principais mudanças, o texto prevê retirar do cálculo da remuneração: o capital social que não for integralizado (ou seja, o que não está efetivamente na empresa, mas apenas no papel); as variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes, que não envolvam efetivo ingresso de ativos à pessoa jurídica, com aumento patrimonial em caráter definitivo, independentemente do disposto nas normas contábeis; e as reservas de capital formadas com lucro líquido decorrente de doações ou subvenções governamentais para investimentos.

Ainda sobre a reserva de capital, só valerão para fins de cálculo do JCP as reservas “constituídas pelo ágio entre o preço de emissão das ações e o valor nominal ou aquelas formadas na constituição da companhia se o valor nominal não for fixado”.

O impacto financeiro será altíssimo, conforme exemplo da Ambev, trazida na matéria da revista Exame:

“Em 2022, 80% do lucro da Ambev foi distribuído na forma de juros sobre capital próprio. A principal mudança diz respeito à forma como é calculada a base para a distribuição de JCP. Hoje, a empresa usa o capital emitido, reservas e lucros retidos, o que totaliza R$ 164 bilhões. Com a nova lei, essa base passaria para R$ 75 bilhões, ou menos da metade, nas contas do banco.”

 O principal problema desta alteração legislativa, que coloca restrições para a dedutibilidade dos Juros sobre o Capital Próprio, é a forma com que foi feita.

O STF, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5.127, em 2016, decidiu que o Congresso Nacional não pode incluir, em medidas provisórias, emendas parlamentares que não tenham pertinência temática com a norma.

Tal prática constitui contrabando legislativo. Como se extraí do voto na citada ADI, o STF entendeu que “caracterizado pela introdução de matéria estranha a medida provisória submetida à conversão, não denota, a meu juízo, mera inobservância de formalidade, e sim procedimento marcadamente antidemocrático, na medida em que, intencionalmente ou não, subtrai do debate público e do ambiente deliberativo próprios ao rito ordinário dos trabalhos legislativos a discussão sobre as normas que irão regular a vida em sociedade.”

Assim, a inclusão das restrições à dedutibilidade dos Juros sobre o Capital Próprio, feita por meio de uma emenda em medida provisória que tratava das subvenções, parece ser inconstitucional nos termos em que decidiu o STF na ADI 5.127/2016

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